A missão de gerir uma propriedade de leite, independentemente do tamanho, é composta por diversas frentes de trabalho e detalhes que precisam ser constantemente observados e revisados. O conhecimento pleno sobre a dinâmica do próprio negócio é imprescindível para tomar decisões, planejar o futuro e corrigir rotas.



O grande desafio para o produtor, no entanto, é conseguir sair da teoria para a prática. Assim, para que a administração se torne efetiva, é necessário que haja um planejamento estratégico e operacional da propriedade. Na visão do professor Paulo Fernando Machado, da Esalq/USP, quando o assunto é gestão, ainda há um longo caminho a ser percorrido:

  • Infelizmente percebemos que muitos produtores não param para organizar o próprio negócio ou não sabem como fazer. E há casos também em que o leite não é a atividade primária da propriedade, fazendo com que certos princípios sejam lembrados apenas em momentos de crise.

Machado sugere que os produtores interessados em organizar o seu negócio devem começar olhando para os seus processos tanto os administrativos quanto os operacionais:

  • Uma fazenda leiteira possui uma série de procedimentos rotineiros que devem ser organizados e sistematizados. É importante definir quais tarefas e quando elas devem ser executadas, como realiza-las, os responsáveis por tarefa e, principalmente, criar métodos para avaliar se tudo está saindo conforme planejado. Este último ponto chamamos de gestão da rotina.

Além desses cuidados, o produtor deve também se atentar para a gestão da sua mão de obra. Neste caso, práticas como descrição das funções, treinamentos, planos de cargos e salários e o oferecimento de benefícios que despertem a motivação dos funcionários são sempre bem-vindas.

A busca por uma gestão eficiente não para por aí. A organização dos meios, como instalações e máquinas e das informações financeiras são quesitos que merecem atenção permanente. Por fim, depois de estruturar bem os processo, a rotina, as pessoas e as questões estruturais e financeiras, chega a fase da gestão da inovação, que nada mais é do que a busca por melhorias contínuas, conforme completa o professor da Esalq/USP:

  • Aqui, o produtor precisa olhar para dentro do negócio e ver se tudo está indo bem e o que é possível fazer para tornar o seu negócio ainda mais eficiente.
O Tripé da Eficiência

Gestão de Pessoas

Na gestão financeira da propriedade, o pecuarista deve saber quanto custa o litro do seu leite. O cálculo do custo de produção e o controle do fluxo de caixa, estruturados por meio de um planejamento financeiro e operacional, são demonstrativos que garantem ao gestor a melhor estratégia e o melhor caminho a ser seguido. O primeiro passo que o produtor deve dar, segundo o chefe-adjunto da Embrapa Pecuária Sudeste, Marco Aurélio Bergamaschi, é anotar todos os gastos que ele tem com a produção leiteira. Da mesma forma, todo o dinheiro que entre deve ser computado, permitindo analisar com clareza se a receita está superando os gastos:

  • É muito importante o pecuarista fazer o controle total do seu fluxo de caixa. Isso evita surpresas e prejuízos e permite que ele adote medidas para equilibrar suas finanças.

Com relação ao conhecimento do custo de produção de uma fazenda leiteira, este passo demanda uma boa organização e disciplina. Dados do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) e do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) revelam que apenas 25% das empresas agropecuárias conhecem o custo de produção do seu produto final. Se esta margem fosse maior, certamente o agronegócio brasileiro, incluindo a pecuária leiteira, seria mais eficiente.

Dica para a Gestão Financeira

Para facilitar o controle financeiro, o gestor de Agronegócios do Sebrae de São Paulo, José Guilherme Nogueira, orienta que o indicado é separar os custos em dois tipos: os fixos e os variáveis.

Nos custos fixos, podem ser considerados os salários dos funcionários, despesas com escritório, impostos, seguros, IPVA do veículo utilizado no trabalho com o leite, custos de manutenção, taxas diversas e outros gastos relacionados à estrutura necessária para a produção. Em paralelo, os custos variáveis compreendem gastos com alimentação dos animais (farelos, ração, silagem), medicamentos, combustível, funcionários temporários, energia, produtos químicos utilizados na higienização da ordenha, inseminação, adubo, sementes de pastagem e demais despesas ligadas diretamente à produção do leite. Os custos variáveis aumentam ou diminuem de acordo com o tamanho do plantel e, consequentemente, com a quantidade de leite produzida. Nogueira explica:

  • Com a separação dos custos fixos e variáveis já podemos ter um melhor entendimento da dinâmica de custos na propriedade, facilitando a análise do negócio e a comparação com outras fazendas do mesmo porte para entender se esses valores estão altos ou baixos. Isso ajuda a enxergar se está havendo desperdício ou eficiência. Após a coleta desses custos em um determinado tempo, que pode ser mensal ou anual, basta dividir a produção total pelo custo empregado neste período. Com isso, temos o custo de produção por litro produzido.

Conhecer e determinar despesas fixas e variáveis ajuda o produtor a identificar o que exatamente ele paga e o que interfere no custo se ele produz mais. É justamente por isso que a fazenda precisa ter todas essas informações na ponta do lápis. Do contrário, o dinheiro se perde no meio dos processos.

FIXOS x VARIÁVEIS

Nogueira ainda esclarece que dentro do custo fixo também há gastos que não necessariamente demandaram desembolsos, como é o caso da depreciação das máquinas, equipamentos e construções. Para ilustrar o cálculo de depreciação de máquinas, ele utiliza o exemplo de um trator. Neste caso, basta subtrair o valor da compra pelo valor atual e dividir pelo tempo de utilização do bem. Ou seja, se um trator custou R$ 80.000,00 e depois de 10 anos eles está valendo R$ 30.000,00, temos um custo de depreciação anual de R$ 5.000,00 (R$ 80.000,00 – R$ 30.000,00 = R$ 50.000,00 / 10 anos = R$ 5.000,00).


NA PRÁTICA

Conheça o IDEAGRI

Quem segue esses princípios à risca é a Fazenda Santa Rita/Agrindus, em Descalvado, SP. De acordo com o diretor da propriedade, Roberto Jank Júnior, a essência da gestão financeira está, justamente, na realização de uma boa coleta de dados econômicos:

  • São muitos itens de custo envolvidos em uma operação de produção de leite, sendo que nem todos seguem a mesma periodicidade. Vários custos têm ciclo anual, como produção de forragens, outros são semestrais (estoque de alimentos disponíveis apenas em parte do ano, como polpa cítrica e caroço de algodão) e também mensais e diários.

Diversas são as ferramentas disponíveis no mercado que auxiliam o produtor a registrar seus custos e ter um quadro real sobre suas finanças. Muitos institutos de pesquisa, como a Embrapa, universidades e consultorias possuem planilhas voltadas para esse fim, que devem ser bem compreendidas e utilizadas no dia a dia.

Além disso, há programas de computadores que são mais indicadores para as médias e grandes operações, que possuem uma quantidade maior de dados. Jank Júnior, da Santa Rita, sugere os chamados sistemas de gestão empresarial, mais conhecidos como ERP (Enterprise Resource Planning).

Além dessas soluções, também existem softwares especializados na gestão do agronegócio. O especialista Gabriel Cardozo Lara, da ViaVerde Consultoria Agropecuária, conta que testes que ele realizou com um programa chamado IDEAGRI apresentaram resultados bem satisfatórios. Lara alerta:

  • Vale lembrar também que, além de efetuar um bom controle de todos os custos e entradas de dinheiro, é importante o produtor conhecer o real valor de seu patrimônio por meio de um inventário bem feito e estar atento aos prazos de pagamentos e obrigações legais.

Outra recomendação dos especialistas para praticar uma gestão eficiente é separar totalmente o controle e a organização da propriedade das despesas familiares, de forma que seja possível obter um cenário claro e verdadeiro das finanças da fazenda.


GESTÃO ZOOTÉCNICA

Outra questão bem difundida e debatida, mas que nem sempre é fácil de pratica, é a gestão do rebanho. Da mesma forma que é preciso fazer a gestão econômica, também é preciso fazer um bom controle zootécnico, ou seja, planejar todos os passos que devem ser dados em relação ao manejo. Afinal, isso impacta diretamente na produção e rentabilidade do negócio.


O médico veterinário da Coordenadoria de Assistência Técnica Integral de São Paulo (Cati), Carlos Pagani Netto, orienta que o produtor, independentemente do seu porte, deve controlar todos os eventos que ocorrem com o plantel, como nascimentos, mortes, coberturas, inseminação, parições, manejo sanitário, pesagem de bezerras e novilhas, dentre outras rotinas:

  • Também é recomendo que o produtor realize, pelo menos uma vez por mês, o controle leiteiro por meio da pesagem da produção de cada animal em um determinado dia. Esse controle é importante para a distribuição dos lotes de animais na propriedade e determinação da dieta.

Netto também chama a atenção para o controle individual dos animais, onde cada vaca necessita de uma ficha própria para o registro das informações diversas, como nascimento, enfermidades, vacinas, testes, o histórico produtivo, dentre outros dados. Além disso, também faz parte da gestão zootécnica saber quantas vacas estão em lactação e quantas estão secas, identificar o cio e monitorar um eventual retorno ao cio após a monta ou inseminação.

Gestão dos índices

A análise de índices zootécnicos também auxilia o produtor a identificar problemas e a corrigir rotas. Para Bergamaschi, da Embrapa Pecuária Sudeste, um bom índice é a avaliar a produção por hectare por meio da divisão entre produção e área da fazenda utilizada:

  • Outro importante índice a ser definido para avaliar um sistema de produção é a quantidade de vacas em lactação por unidade de área, pois correlaciona quatro fatores fundamentais do processo produtivo: a capacidade de produção de forragens (produtividade das pastagens tropicais e das forrageiras utilizadas no inverno), a eficiência reprodutiva, a persistência das vacas e a composição do rebanho. Valores entre três e quatro vacas em lactação por hectare são considerados muitos bons e têm sido obtidos pelas propriedades participantes do Projeto Balde Cheio.

A renda por hectare também é uma forma de gerir a performance da fazenda. Bergamaschi explica:

  • Fazendo uma simulação com uma produção diária de 1.000 litros de leite, o que equivale a uma produção anual de 365.000 litros, e considerando a área útil de 18,2 hectares, a produtividade da atividade leiteira será de aproximadamente 20.000 litros de leite/ha/ano. Com uma margem de lucro em torno de R$ 0,10/litro de leite, a renda líquida por unidade de área por ano será de R$ 2.000,00/ha/ano, valor este superior a várias opções agrícolas de uso do solo. O porcentual de vacas em lactação em relação ao rebanho total e à quantidade de leite produzida por animal também são indicadores importantes para mensurar a eficiência do rebanho. O Projeto Balde Cheio, por exemplo, possui diversos índices e ensina os produtores a forma calculá-los. O registro de todos os eventos rotineiros do rebanho é fundamental para a gestão zootécnica.

No caso da Fazenda Santa Rita, que possui 1.400 vacas holandesas, as informações de produção são coletadas diariamente pela identificação por brinco eletrônico no momento da ordenha. Jank Júnior defende:

  • Importante lembrar que o conforto dos animais também é um pilar da gestão. Sem conforto não há estabilidade da produção ao longo do ano e é essa estabilidade que paga as contas.


O que envolve o planejamento


A Fazenda Santa Rita/Agrindus é cliente e usuária do Sistema IDEAGRI.