Formado pela Universidade de Wisconsin, EUA, Donald Meyer é presidente do laboratório Rock River, que começou suas operações em 1976 com análises de solos e de alimentos. Ele foi um de seus fundadores e presidiu por vários mandatos a NFTA, a associação americana para análises de forragens. Em sua última passagem pelo Brasil, firmou uma parceria com o Rehagro, iniciando as atividades por aqui. Trata-se do laboratório 3RLab. Nesta entrevista, exclusiva a Balde Branco, ele fala do empreendimento e conta, também, sobre sua experiência na atividade. Com essa iniciativa brasileira e outra semelhante no México, Don Meyer está à frente do maior laboratório de análises bromatológicas do mundo.

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Atualmente, os laboratórios Rock River realizam 160 mil análises de solos e 70 mil análises de alimentos por ano. Foi o primeiro laboratório nos Estados Unidos a utilizar a técnica de NIRS (espectroscopia de comprimento de luz próximo ao infravermelho). Isso aconteceu em 1983, e essa técnica é empregada, hoje, em 90% das amostras de alimentos. Análises químicas também sido realizadas no laboratório.

No início das atividades, as principais análises eram de proteína bruta, umidade, cálcio e fósforo. Atualmente, devido aos avanços na área de nutrição animal, existe uma grande demanda por realizar uma ampla variedade de análises, como digestibilidade de amido, fibra em detergente neutro (FDN), micotoxinas, micro- minerais, entre outros.

Devido à NIRS ser um método que não destrói o alimento, esta pode ser calibrada para muitos nutrientes. Com isso, se tornou um método de análise barato e muito utilizado, não só nos Estados Unidos, como também em vários países, devido à sua velocidade e acurácia.

Don Meyer aprendeu a trabalhar com a NIRS com John Shank, um dos grandes conhecedores desse método. Desde então, tem desenvolvido curvas de calibração para uma variedade de alimentos e nutrientes.


Balde Branco - O que levou o Sr. a se tornar empresário na área de análise de alimentos?

Don Meyer - Em 1977 fui procurado por uma empresa americana que precisava de um laboratório para analisar alimentos de fazendeiros. Eles emprestaram o dinheiro para comprarmos os equipamentos e providenciaram uma quantidade suficiente de amostras para que o laboratório fosse rentável. Em nosso primeiro ano analisamos aproximadamente 1.500 amostras e hoje estamos acima de 70.000.

BB - Por que investir em uma empresa no Brasil?

DM - Porque encontrei um bom sócio no Brasil. O pessoal do Rehagro me perguntou se o Rock River analisaria alimentos nos Estados Unidos e eu disse que deveríamos pensar em um laboratório no Brasil. Sendo um homem de negócios. Confesso que vejo muito pouca competição para um laboratório no Brasil. Acredito que com esse tipo de projeto podemos gerar um impacto muito grande na pecuária de leite do País.

BB - A propósito, como o Sr. vê a pecuária de leite brasileira?

DM - A pecuária de leite no Brasil não está utilizando as ferramentas mais modernas para balanceamento de dietas. Os técnicos tem softwares destinados a este fim, mas não possuem a análise para fazer um balanceamento correto. Existem muitas tecnologias novas vindo das universidades de Wisconsin e de Cornell que não estão sendo empregadas por aqui. Acredito que podemos modificar isto, mas sabemos também que grande parte dos técnicos não consegue visualizar o valor de uma análise. Certamente, este é o nosso primeiro passo, ou seja, mostrar e ensinar isso a eles. Já os técnicos que empregam tais recursos precisam fazê-lo com mais frequência, pois uma silagem do começo do silo é um alimento completamente diferente de uma silagem depois de sete dias de utilização.

BB - Quais os produtos do laboratório e o impacto que os pecuaristas brasileiros devem esperar da utilização destes nas fazendas?

DM - Recentemente desenvolvemos uma nova análise com o professor David Combs, da Universidade de Wisconsin. Trata-se de um produto identificado pela sigla TTNDFD, que se refere a digestibilidade do FDN no trato gastrointestinal total. Quando você compara TTNDFD de duas amostras, a amostra com índice mais elevado irá resultar em maior produção de leite. É uma ferramenta bastante simples de ser utilizada e também muito precisa em predizer a produção de leite. Outro produto que certamente irá ajudar muito os técnicos brasileiros é a detecção de porcentagem de amido nas fezes. Fezes sem presença de grãos não significa fezes sem amido. Esta analise irá ajudar o técnico a pensar em inúmeras opções para melhorar a digestibilidade do amido pelo animal. Uma análise muito interessante e de muito valor é o KPS (kernel processing score, ou seja, escore de processamento de grãos), que permite identificar se os grãos da silagem de milho estão danificados o suficiente ou não. Isto muda toda a avaliação da dieta em uma fazenda.

BB - Em suas apresentações, o Sr. tem destacado a importância da NIRS. O que é exatamente a NIRS?

DM - Basicamente jogamos uma Iuz em um alimento e o comprimento de onda da luz reflectante é característico de um nutriente. Como a proteína, por exemplo. Assim, podemos predizer a porcentagem de proteína de um alimento. É um excelente equipamento quando se sabe utilizar.

BB - Sabemos que a NIRS não a uma tecnologia nova. Qual é a chave do sucesso na utilização deste equipamento?

DM - Realmente não é uma tecnologia nova, foi desenvolvida em 1970, mas passou a ser mais utilizada a partir de 1980. A chave para o sucesso está na calibração, que deve ser feita por um laboratório de qualidade, em amostras que representem os alimentos que o laboratório irá analisar. Se estivermos analisando material do Brasil precisaremos de amostras obtidas no País, na curva de calibração. Já coletamos amostras de vários estados, justamente para representar os alimentos presentes no Brasil.

BB - Fale-nos um pouco de sua experiência com analises de alimentos.

DM - Ao balancear uma dieta a partir da análise de alimento, em vez de recorrer aos valores de livros, se pode facilmente aumentar a produção de leite. Recentemente, John Goeser, diretor de pesquisa e desenvolvimento de novos produtos do Rock River, escreveu um artigo na revista Hoards Dairyman mostrando a utilização do produto TMR- D (digestibilidade da dieta completa). O nutricionista da fazenda utilizou este produto em uma dieta com 50% de forragem e notou que a digestibilidade da forragem estava acima da média americana. Dessa maneira, ele resolveu aumentar a quantidade de forragem na dieta para 55% e não houve alteração alguma em produção de leite, escore dos animais ou sólidos. Esta mudança na dieta causou um impacto positivo muito grande na fazenda. É este tipo de ferramenta que acreditamos que os técnicos brasileiros precisam utilizar.

BB - Quais parâmetros são importantes para classificar uma forragem?

DM - Hoje estamos muito confortáveis com TTNDFD, porque este número pode ser utilizado para comparar forragens diversas como, por exemplo, alfafa versus silagem de milho.

BB - Qual o futuro para a análise de forragem?

DM - No futuro, mais métodos serão desenvolvidos. Com certeza, estaremos calibrando NIRS para predizer aminoácidos, perfil de ácidos graxos, etc. E assim poderemos balancear a dieta para aminoácidos e ácidos graxos. Além disso, estou trabalhando com a empresa americana Digistar no desenvolvimento de uma NIRS que pode ser utilizada na fazenda, a fim de determinar a matéria seca da forragem rapidamente e com qualidade. Este equipamento foi apresentado recentemente na exposição mundial de gado de leite de Madison, em Wisconsin.

BB - Como o Sr. compara os resultados dos laboratórios Rock River com os concorrentes nos Estados Unidos?

DM - A maioria dos laboratórios que analisa forragem nos Estados Unidos é certificada pela NFTA, uma associação que controla a qualidade da forragem. Por isso, a comparação entre laboratórios mostra resultados muito próximos. Mas nem todos os laboratórios fazem todas as análise que realizamos. O Rock River é o único laboratório que pode realizar TTNDFD e também digestibilidade total da dieta completa (TMR- D). Além disso, temos uma qualidade de atendimento excelente, e somos o único laboratório que tem um PhD em atividade, o Dr. John Goeser, com sua vasta experiência na criação de gado de leite. Ele é um dos maiores especialistas na área de digestibilidade de fibra.

BB - O que os pecuaristas brasileiros devem esperar do 3RLab?

DM - Análises rápidas, com acurácia, e excelente atendimento. Esta proposta a uma das razões porque o laboratório Rock River fez sociedade com o Rehagro no Brasil. Contratamos Marcelo Ramos, que tem PhD nos Estados Unidos, para ser nosso diretor do laboratório. O Rehagro também, como uma empresa de educação na área do agronegócio tem objetivos muito semelhantes aos do nosso laboratório. Juntos, deveremos levar conhecimento aos produtores e fazê-los entender como utilizar as análises para produzir mais leite. Antes de iniciar o laboratório no Brasil. o Rock River trabalhou 10 meses analisando amostras brasileiras para calibrar a LAIRS do 3RLab, e vamos continuar suprindo essas análises.

BB - Quais são os diferenciais que o 3RLab pretende oferecer ao produtor brasileiro?

DM - O 3RLab está começando com o conhecimento que acumulamos durante 37 anos analisando amostras nos EUA. Esperamos que este conhecimento e expertise diferenciem o 3RLab dos outros laboratórios no Brasil. Desenvolvemos toda a logística para coleta de amostragem fazendas, com o objetivo de facilitar achegada delas no laboratório. O 3RLab também terá o selo de qualidade americano da NFTA. Isto significa que o resultado das análises dos alimentos deverá estar sempre dentro da faixa de aceitação da NFTA para o laboratório continuar com o selo. Portanto, teremos no Brasil um laboratório com qualidade americana.

BB - Como é o use da análise de alimentos pelos nutricionistas nos Estados Unidos?

DM - Acredito que os nutricionistas dos EUA hoje dependem de análises de forragem para balancear as dietas com acurácia. Eles estão balanceando a dieta utilizando digestibilidade de fibra, digestibilidade de amido, amido nas fezes etc. Nos Estados Unidos ou no Brasil, um nutricionista não pode formular uma dieta com acurácia sem análise.

BB - O 3RLab também trabalhara com solos no Brasil. O Sr. pode comentar sobre isto?

DM - A proposta é que, após o estabelecimento do 3RLab como um laboratório de análises de alimentos e forragem, possamos adicionar os serviços de solos. As análises de solos iniciarão em 2015.

BB - Análises de solos, diferentemente de analises de forragem, são um negócio estabelecido no Brasil. Como se posicionará o 3RLab para competir com os laboratórios existentes?

DM - A diferença entre o que é oferecido hoje no Brasil e o que o 3RLab irá oferecer a principalmente suporte e atendimento ao cliente. Teremos técnicos treinados prontos para responder às perguntas que os agricultores ou agrônomos tiverem sobre as análises oferecidas. Também esperamos que os resultados das análises de solos estejam prontos em três dias uteis. Além disso, estamos trabalhando para que nossa equipe de coleta de solos atue nas fazendas dos nossos clientes. Mas pretendemos ir além das análises. Vamos fornecer todo o serviço de grid, com adoção de GPS e, muito provavelmente, também aplicação de fertilizantes com taxa variável. Em resumo, atuaremos desde a coleta, ajuda na interpretação, geração de grid até a aplicação de fertilizantes.

BB - Uma curiosidade: nos Estados Unidos qual a porcentagem de agricultores que utiliza agricultura de precisão?

DM - Nos Estados Unidos, a agricultura de precisão está crescendo. Atualmente, eu diria que 50% dos agricultores utilizam agricultura de precisão nas suas fazendas.

BB - Antes de visitar o Brasil, o Sr. tinha uma imagem sobre a pecuária leiteira de nosso país. Agora que teve a oportunidade de conhecer algumas fazendas, algo mudou?

DM - Minhas impressões sobre a pecuária leiteira do Brasil não mudaram muito. Eu sempre soube que boa parte dos grandes rebanhos leiteiros utiliza tecnologia de ponta, mas notei também a necessidade de introduzir análise de forragem avançada. Os laboratórios RockRiver tem um excelente relacionamento com o departamento de gado de leite da Universidade de Wisconsin, e através deste contato conheci muitos estudantes brasileiros excepcionais. Quando esses estudantes retornam ao Brasil trazem muitas informações sobre a nutrição, que é de ponta.

BB - Nos Estados Unidos demorou um pouco para as nutricionistas entenderem valor da análise de forragem. Quanto tempo o Sr. acredita que levará para os nutricionistas brasileiros atingirem esse entendimento?

DM - Acredito que os nutricionistas brasileiros entenderão o valor da análise muito mais rapidamente que as americanos. Foi na década de 80 que passamos por essa mudança pela qual o Brasil irá passar. Desde então, já houve uma grande quantidade de congressos e professores renomados recomendando análise de forragem. Hoje, nos Estados Unidos, essa metodologia é o que chamamos de "no brainer", ou seja, não se pensa mais a esse respeito, simplesmente a forragem é coletada e enviada ao laboratório. Com um médico precisa do estetoscópio; o engenheiro, de uma calculadora; o mecânico, de uma chave, o nutricionista precisa de análise. Portanto, a parte mais difícil já aconteceu. Estamos preparando uma ação muito grande com relação a educação dos técnicos em conjunto com o Rehagro. Portanto, espero que as técnicos e produtores consigam entender o valor da análise muito rapidamente. Esperamos analisar 20.000 amostras de forragem durante o ano de 2015.

BB - Para concluir: se houvesse uma chance de iniciar uma fazenda de leite no Brasil, o Sr. investiria?

DM - Sim, acredito que sim. O Brasil é um país muito bonito, com várias oportunidades para se ter sucesso na pecuária de leite.


Fonte: Revista Balde Branco, novembro de 2013


Para mais informações sobre o 3RLab, acesse: http://www.3rlab.com.br